As reclamações de um calendário pesado de jogos e campeonatos não pertencem apenas ao futebol brasileiro, como gosta de ressalvar o técnico Abel Ferreira, do Palmeiras, e alguns outros treinadores no Brasil. A Europa começa a discutir o mesmo problema com mais seriedade e representações na Fifa.

O Sindicato dos jogadores de futebol e as Ligas Europeias fizeram uma denúncia formal ao presidente Gianni Infantino, da Fifa, e também aos representantes da Uefa sobre a quantidade de jogos na temporada e os poucos dias de recuperação dos jogadores de uma partida para outra. Há muitos torneios, como o novo Mundial de Clubes.

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São mais de mil clubes europeus e 33 ligas nacionais assinando o documento de repúdio ao calendário atual de jogos. Na Europa, essas entidades paralelas à gestão do futebol, como o sindicato, são mais fortes do que no Brasil e têm mais vozes ativas, com boa representatividade dos jogadores profissionais dos principais times.

Gianni Infantino, presidente da Fifa: pressão para reduzir torneios e jogos na temporada / Fifa

O apelo é pela saúde dos atletas. Física e mental. Mas também é por uma melhor qualidade do jogo. Jogadores descansados e “inteiros” atuam melhor. Já vimos isso em Copas do Mundo, quando os craques da Europa chegavam ao torneio mundial arrebentados pelo desgaste da temporada. Os clubes Europeus gostam de suas competições, como a liga nacional, a Copa do país e a Champions League. O resto é o resto. O Mundial de Clubes da Fifa entra como “resto”.

No Brasil, o calendário é soberano. Nada é mais importante do que os 90 minutos de uma partida oficial. A CBF alega que todos os clubes assinaram o calendário e concordaram com ele. Não é assim que a banda toca.

Os clubes e as entidades esportivas brasileiras, como associações e sindicatos, não participam de nada na CBF. Os próprios clubes não são consultados sobre o calendário. Recentemente, o técnico Tite, do Flamengo, mandou um recado direto e provocador ao responsável dentro da CBF pelo calendário dos jogos do Brasileirão. Tite conhece o profissional pelos seus anos dentro da entidade quando era treinador da seleção.

Na Europa, a bronca é a mesma: o calendário é feito de forma unilateral. Ou seja: sem consultar quem mais interessa: jogadores e clubes. No futebol não se permite mais fazer nada sem consultar as partes envolvidas. Se os jogadores estão reclamando do desgaste físico, é preciso acreditar e apresentar soluções. Médicos e fisiologistas também devem ser ouvidos. O torcedor também merece ser ouvido, afinal é ele quem paga a conta.

Ednaldo Rodrigues, da CBF, e Infantino, da Fifa: calendário desumano no futebol / CBF

O calendário do futebol não pertence às entidades esportivas, mas aos jogadores e aos torcedores. Os jogadores são os profissionais que fazem o espetáculo. Os torcedores são para quem eles correm, a finalidade de tudo. O restante está lá para viabilizar o jogo.

O calendário de jogos internacionais está supersaturado e é insustentável para as ligas nacionais e para a saúde dos jogadores. As decisões adotadas pela Fifa privilegiaram as suas próprias competições e os seus interesses comerciais.
comunicado endereçado à Fifa

Inglaterra, França e Itália pegaram carona com a Espanha em outra reclamação formal no Tribunal Comercial de Bruxelas. Essas ligas se queixam de que o calendário dos jogos viola o Direito de Competição da União Europeia e “constitui um abuso de posição dominante“, no caso, a Fifa.

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A Fifa deu a resposta que costuma dar nesses casos, como faz também a CBF e a Conmebol. Na verdade, a Confederação Sul-Americana de Futebol quase não aparece nesses imbróglios, mantendo seu silêncio sobre o tema. Na resposta da Fifa, os argumentos dizem respeito à aprovação de todos para a realização dos torneios e do calendário.

O calendário atual foi aprovado por unanimidade pelo Conselho da Fifa, que é composto por representantes de todos os continentes, incluindo a Europa, após uma consulta abrangente e inclusiva, que incluiu o Sindicato e órgãos da liga. O calendário da Fifa é o único instrumento que garante que o futebol internacional possa continuar a sobreviver, coexistir e prosperar ao lado do futebol de clubes nacional e continental.
FIFA

A entidade foi além e também saiu atirando contra a parte comercial das ligas da Europa e suas intenções comerciais sobrepondo a qualquer outra situação, inclusive o respeito ao jogador e sua saúde. A Fifa não baixou a guarda. Chamou algumas ligas de “hipócritas”.

Algumas ligas na Europa – elas próprias organizadoras e reguladoras de competições – agem com interesse comercial, hipocrisia e sem consideração por todas as outras pessoas no mundo. Aparentemente, essas ligas preferem um calendário repleto de amistosos e tours de verão, muitas vezes envolvendo extensas viagens pelo mundo.
FIFA

O futebol brasileiro tem agora um caminho se quiser entrar nessa briga por menos jogos ou jogos mais espaçados, como pedem os treinadores brasileiros, únicos a tocar nessa ferida no país. É preciso entender que menos partidas e mais tempo para descanso e treinos tornam os 90 minutos mais bem jogados e disputados. Isso quer dizer um futebol mais vistoso e valorizado. Não é frescura.

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