Quando querem, jogadores derrubam técnicos, sim. Embora essa hipótese seja negada publicamente, é fato que dirigentes de clubes muitas vezes optam pela mudança de treinador para atender interesses de um ou de um grupo de atletas que exercem certa liderança sobre o elenco, os caras que dão as cartas no cotidiano do vestiário. A história está repleta de casos que valem como exemplo dessa influência. Ramón Díaz e seu filho Emiliano são as vítimas da vez.
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Apenas 21 dias depois de terem levado o Timão a um título de campeão que não se conquistava havia seis anos, pai e filho foram dispensados pelo presidente Augusto Melo como consequência de um descontentamento de alguns atletas com o trabalho desenvolvido.

Nesse cenário emerge como figura central o holandês Memphis Depay, que escancarou publicamente os problemas táticos da equipe sob as ordens dos argentinos. Problemas que, aliás, existem de fato, e viviam encobertos pelo manto de vitórias pontuais.
Memphis não foi um traíra
Nem sempre essa relação de causa e efeito é tão evidente. Muitas vezes o que acontece é um processo que vai minando o terreno para a sepultura do treinador. Não há uma briga propriamente dita, um embate de ideias, um conflito de relacionamento, nem um pedido formal de dispensa. Memphis, de fato, não agiu assim, como se fosse um traíra com os chefes.
Mas no futebol, sempre que um treinador está na berlinda, as coisas vão acontecendo aos poucos e os resultados negativos vão ajudando a construir o ambiente favorável para a demissão.
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Mesmo quando tudo parece sob controle, a corda se rompe e o treinador é mandado embora. Sempre é muito mais fácil demitir o técnico do que abrir mão de 20, 25 jogadores. Mesmo que o grupo não tenha razão, o treinador paga o pato por ser a parte mais fraca da equação.
O campo falou mais alto
O retrospecto da família Díaz no comando do Corinthians não justificaria uma demissão neste momento. A diretoria já tinha tido ocasiões mais oportunas para fazê-lo, desde o ano passado. Mas a súbita melhora da equipe na reta final do Brasileirão-24 deu sobrevida a Ramón e seu filho. Tanto que o ano começou com contrato renovado e esperança de mais conquistas. O campo, no entanto, falou mais alto.
A despeito do aproveitamento superior a 70%, as deficiências táticas do Corinthians eram evidentes. Tão claras quanto à falta de resposta do treinador para corrigir problemas crônicos que apareciam no time mesmo nos dias de vitórias.

Coisas muito óbvias como a dificuldade para sair jogando, o mau posicionamento da defesa, os gols sofridos em bolas aéreas, a falta de cobertura nas laterais, a fragilidade na marcação próxima à área, e, sobretudo, a ineficácia de todas as tentativas buscadas para suprir a ausência de Garro na armação ofensiva da equipe.
Tudo isso parecia normalizado. Até que Memphis resolveu assumir o papel de líder do grupo e expor tudo isso publicamente, após a melancólica derrota para o Fluminense no Itaquerão. Foi ele falar e… bingo!
Depay não via evolução
O holandês foi claro ao deixar registrado que não via evolução tática da equipe, e que o comando técnico só se importava com os resultados. O próprio Memphis sofreu na carne a carência de ideias de plano de jogo e com as invenções de Ramón nos momentos em que era preciso achar saídas para os problemas.

Muitas vezes Memphis foi chamado a jogar como armador no lugar de Garro, o que levou a dois prejuízos que só Ramón não via: ao trazer Memphis para a posição do ausente Garro, o time não ganhava um meia criativo e perdia um atacante de rara eficiência, que combinava muito bem com Yuri Alberto nas ações ofensivas.
Com esse posicionamento, Memphis resolveu um problema momentâneo, assumindo o papel que muitos corintianos gostariam de ter desempenhado, mas não tiveram nem tamanho nem coragem para exercê-lo. A grandeza de Memphis Depay lhe permitiu dar a cara à tapa para liderar um processo de mudança pretendido por milhões de corintianos.
Memphis é o dono do time
Até aí tudo bem. Resta saber qual é o limite do poder de Memphis Depay no futebol corintiano. Ao que parece, os privilégios garantidos por um contrato surreal, como a exigência da camisa 10 que era de Garro e o pagamento de prêmios de bonificação milionários, não bastam por si só.
De modo que faltava dar a ele a chave do vestiário corintiano. Com ela na mão, Memphis começa a escrever uma nova fase na vida do Timão. E o novo treinador, seja qual for, vai ter de se adaptar à clara evidência de que Memphis é o dono do time – para o bem e para o mal.