Com o fim de linha de alguns craques do futebol mundial, inclusive do Brasil, o futebol de seleções abre caminho para o jogo coletivo. Nem sempre foi assim. Por muitos anos, principalmente na América do Sul, os atletas diferenciados, os chamados acima da média, sempre conduziram suas seleções ao sucesso. Os últimos dessa linhagem são conhecidíssimos: Messi e Cristiano Ronaldo.

Eles ainda conseguem personificar as seleções argentina e portuguesa, respectivamente, sem medo de errar. O Brasil tinha isso até Neymar se perder com tantas contusões graves. Agora, com o elenco reunido nos Estados Unidos para a disputa da Copa América, com início marcado para quinta-feira, o Brasil tem bons jogadores, alguns ótimos atletas e apenas um craque: Vinícius Júnior. Mesmo assim, o atacante do Real Madrid está mais adaptado ao jogo coletivo do que ao duelo individual, embora seja “imbatível” no drible e no um contra um. Vini é craque e tem potencial para crescer. Mas chega em meio a essa mudança no futebol.

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De modo que o futebol das seleções que estamos acompanhando na Euro 2024 e vamos conferir na Copa América enterra de vez a figura do craque capaz de decidir tudo em campo para abrir caminho ao jogo coletivo, posicional, de trabalho coletivo e com vários personagens aparecendo para resolver os problemas na frente do gol. Tanto é assim que a artilharia nessas competições é baixa porque muitos jogadores marcam gols.

Argentina, de Lionel Messi, ganha a Copa América de 2021 no Brasil / Conmebol

Os sul-americanos, principalmente os brasileiros e os argentinos, têm mais dificuldades para assimilar essa mudança de mentalidade e postura porque foi nessa parte do planeta que muitos craques decidiram resultados, campeonatos e Copas sozinhos. Temos a tendência a personificar as equipes e as seleções, como a Argentina de Maradona e depois de Messi. Ou então o Brasil de Pelé e Garrincha, de Zico e Sócrates, de Romário e Ronaldo. A verdade é que gostamos disso e procuramos esses craques para aplaudir.

Ocorre que esses jogadores são cada vez mais raros. Estão em extinção, mesmo aqueles que são acima da média relutam em assumir esse papel e carregar o piano sozinho. Não fazem isso de propósito, mas sempre deixam dúvidas nos torcedores. Jogam uma boa e uma ruim. Duas partidas excelentes e depois “desaparecem” na sequência. Tem a ver com velocidade e dinâmica das partidas, mas não somente isso.

Os craques estão desaparecendo. E os que ainda estão em campo ficaram velhos, como Messi e Cristiano Ronaldo. Velhos no sentido de que o corpo não aguenta mais como antes. Messi tem 37 anos. CR7, 39. Recentemente, numa transmissão da Euro 2024 no SporTV, o ex-atacante Dodô disse que o corpo, depois de uma certa idade, “doi muito”.

Pep Guardiola, do Manchester City, é um dos melhores treinadores do mundo / Instagram City

Então, é quase uma questão de sobrevivência que o futebol mude do jogo personificado e quase que individual  para o jogo coletivo e participativo. Na Europa, talvez a única seleção que tenha esse jogador diferenciado a ponto de concentrar suas ações em seus movimentos é a França, de Mbappé. Não vejo mais nenhuma outra equipe, a não ser Portugal, já mencionada. Na América do Sul, após Messi se aposentar, a Argentina também entrará nessa condição. A falta de craques amadureceu os treinadores. Fez com que eles pensassem mais o jogo para encontrar os caminhos da vitória.

A era dos treinadores

Sem esses atletas iluminados, quem ganha espaço é o treinador. As seleções têm menos técnicos em condições de astros, mas os clubes abusam dessa movimentação, de modo a fazer do “mister” ou do “professor” os mais bem pagos e badalados dos elencos. Pep Guardiola é o maior de todos. O treinador do Manchester City é o grande engenheiro das conquistas do time inglês. Pep entendeu rapidamente essa mudança e passou a valorizar o jogo coletivo.

Abel Ferreira tenta fazer o mesmo no Palmeiras. A confusão armada por Dudu foi uma prova disso. Abel disse com todas as letras que os jogadores são iguais e todos têm de fazer o que ele determina, sem exceção. Abel deixou todos no mesmo patamar.

Dorival Júnior treina a seleção brasileira para a Copa América dos Estados Unidos / CBF

Para a Copa América, Eliminatórias e próxima Copa do Mundo, Dorival Júnior tem esse desafio: de ser ele o treinador a acabar com um Brasil que sempre apostou nas jogadas individuais de seus craques para ganhar as partidas e repensar o futebol da seleção de forma coletiva, de ataque e defesa em bloco, de jogo ajustado e com posicionamento definido, o que não quer dizer tirar dos atletas toda a sua habilidade e inteligência para jogar, a ginga e as graças objetivas.

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O que não dá mais é a seleção brasileira esperar que o craque do time, o da vez é Vini Jr., resolva o resultado de uma partida. Isso não existe em lugar nenhum do mundo. Esse, para mim, é o maior desafio de Dorival na seleção. Leva tempo, mas precisa ser entendido e encarado como um projeto. Não é já para a Copa América, embora tudo no Brasil vai começar nesta competição.

Jogos do Brasil na Copa América

Grupo D
24/06 – Brasil x Costa Rica – 22h (de Brasília)
28/06 – Paraguai x Brasil – 22h (de Brasília)
02/07 – Brasil x Colômbia – 22h (de Brasília)

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2 COMENTÁRIOS

  1. […] Dorival comete erros, mas ele também está num posto recém-ocupado e nunca esteve tão alto na cadeia. Tem mais medo do que confiança ainda. Mas não tenho dúvidas de que seja o treinador certo nesse momento. Ele tem de correr contra o tempo e sair da Copa América com algumas formatações. Melhorar alguns setores do time. Dar mais padrão e arriscar. […]

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