Tite mudou pouco de uma Copa para outra. Ele continua sendo um treinador pragmático, adepto aos processos de trabalho no futebol em detrimento do improviso e da ginga características do futebol brasileiro do passado. Está mais para os métodos europeus do que para as concepções brasileiras. Fosse técnico de um time no Brasil, seria um dos melhores dada a cegueira dos seus colegas de profissão da atualidade, mesmo com todos os seus defeitos, e eles são muitos.

Tite já foi mais perfeito. Quando assumiu o comando da seleção brasileira, seu nome era apontado sem sombra de dúvidas para melhorar o time e brigar pelo hexa. Na prática e numa disputa de Copa do Mundo, a da Rússia, Tite deixou a desejar. Fracassou na primeira tentativa é só terá mais uma para entregar o posto e entrar para a história. O futebol, assim como todos nós, tem esse defeito de só se lembrar dos vencedores. Em se tratando de seleção, só vale mesmo se ganhar uma Copa.

Tite segue com suas ideias e ideais. O que já é bom. Não se curvou diante das besteiras feitas pelo seus chefes no comando da CBF, como tomar partido da casa após as acusações e condenação de assédio moral e sexual do presidente Rogério Caboclo. Melhor. Disse não concordar e esperou pelo afastamento. Poderia sair se tudo ficasse como estava. Para muitos, Tite cometeu seu pecado ao aceitar se juntar com essa gente. Treinadores mais respeitados se recusaram a comandar a seleção ao lado dos últimos presidentes da entidade. Quando foi chamado, Tite avaliou tudo isso é ponderou que poderia se isolar dessa gente e dos seus problemas. Há quem diga que esse isolamento é apenas superficial, que Tite é exatamente como os outros que passaram por lá. Só não beija a mão.

No Brasil, essa é uma questão porque há muitas condutas questionáveis no futebol, muita desinformação e interesses pessoais acima da seleção. A velha e a nova CBF tentam limpar sua sujeira, ganhar credibilidade e ser transparente. Não se sabe se vai conseguir. O senso-comum, com o qual concordo, diz que enquanto “essa gente estiver no comando”, nada vai mudar. “Essa gente” são seus dirigentes e parceiros e o jeito que tudo é feito lá dentro.

Não se pode generalizar, claro. Há boas cabeças. Algumas sem comprometimento, honestas. Tite já defendeu os mais próximos de seu trabalho. Ocorre que ele é peça pequena dessa engrenagem e, sem dúvida, faz parte dela.

Fracasso na Copa da Rússia

Na Rússia, quatro anos atrás, Tite morreu abraçado com seu grupo e aos caprichos de Neymar. O melhor jogador do Brasil, assim como todos os outros, não está acima das regras nem das condições de um time em uma Copa do Mundo. Pelé, em 1970, aos 29 anos, mesma idade de Neymar, era exemplo de profissionalismo no México e também antes de a seleção chegar lá. Quem conta isso são seus companheiros da época, que criticam o jeito mimado e infantil de Neymar. Tite não soube controlar isso. Temeu em dar limites. Perdeu respeito da opinião pública.

No Catar, espera-se que tenha aprendido a lição. Descobriu pelo caminho mais doloroso que Copa do Mundo não se resume apenas aos 90 minutos de cada partida – são sete jogos ao todo. Existe muito mais do que isso numa Copa. Ter o grupo jogando a favor do time e unicamente para o time é decisivo. Tite sabe que não teve isso na Rússia. Só equipes uniformes e concentradas ganham Copas. Algumas raras exceções ficaram para a história, como a Hungria de 1954, a Holanda de 1974 é o Brasil de 1982, por exemplo.

Tite é boa pessoa. Mas tem pecados. Um deles é manter seu filho ao seu lado. Não pega bem e nunca será assunto velho, principalmente num país onde os arranjos são cada vez mais descarados. Deveria incentivar o filho a bater asas e seguir seu próprio caminho. Também não aprendeu a enquadrar Neymar, sem regalias e qualquer benefício por ser o melhor de todos. Gratidão é um sentimento louvável, mas precisa aprender que ganhar uma Copa do Mundo está acima disso é que as vezes é preciso tomar decisões duras para salvar o time. Tem de mudar isso em seu perfil. Faz parte do papel de um técnico tomar decisões, por vezes, impopulares.

“Nós tivemos uma participação coletiva importante, com o Neymar bem, o coletivo bem. Talvez as expectativas em cima dele sejam que toda hora ele faça a diferença, que faça excepcionalidades. O jogador é excepcional porque faz jogadas excepcionais e não corriqueiramente. Temos, sim, um jogador diferenciado, sabemos dessa condição, mas ele é bem marcado, às vezes dobram a marcação nele”, disse Tite após empate sem gols com a Colômbia em Barranquilla pelas Eliminatórias.

O Brasil campeão do mundo vai beneficiar a todos, mesmo aqueles jogadores que ficaram pelo caminho e foram úteis em algum momento dessa caminhada. Ser campeão beneficia o futebol brasileiro. Tite precisa entender isso e levar os melhores para a Copa, ferindo ou não egos e sonhos.

Tite tem uma boa seleção 

Dentro de campo, Tite tem o menor de seus problemas. A seleção brasileira é forte e não deve nada para nenhuma outra, mesmo as tradicionais da Europa, que ganharam as últimas Copas. Tite tem bons zagueiros, excelentes volantes e atacantes de respeito e alguns goleadores. E ainda três goleiros acima da média. E tem Neymar. O que mais ele poderia querer? A dúvida é a mesma das Copas perdidas: o Brasil está maduro com essa geração para encarar os europeus, sempre mais concentrados, sérios e focados? Se a resposta for sim, Tite terá boas chances no Mundial do Catar.

Seus números de 2016 para cá são ótimos. Tem duas derrotas que carrega na alma. Para a Bélgica na Copa do Mundo da Rússia, por 2 a 1, que mandou o Brasil de volta para casa, e ainda na decisão da Copa América de 2020, jogada em 2021, quando perdeu para a Argentina por 1 a 0 no Maracanã. Dois tropeços barulhentos. O torcedor brasileiro olha para Tite com mais desconfiança. O treinador espera melhor competência e sorte num ciclo completo de Copa à frente da seleção.