Acabou a farra! No dia 20 de dezembro de 2023, inebriado pelo final vitorioso de uma dura luta política que pôs fim ao reinado do grupo denominado ‘Transparência e Renovação’, o homem que viria a ser o futuro diretor de futebol do Corinthians jogou ao vento a frase que passaria a representar o maior desafio do clube sob a gestão do recém-eleito Augusto Melo.
Seja um parceiro do The Football
Assim, com uma bravata, Rubens Gomes, conhecido nos subterrâneos e alamedas do Parque São Jorge pelo codinome Rubão, prometeu acabar com a hegemonia de Palmeiras e Flamengo e trazer de volta o Corinthians ao palco dos grandes protagonistas do futebol brasileiro.

A hora da redenção chegou, após uma batalha em campo que terminou empatada em 0 a 0, graças ao goleiro Hugo, de novo o herói da Fiel, que defendeu um pênalti cobrado por Rafael Veiga no segundo tempo.
Da desconfiança ao título
De lá até a noite desta quinta-feira, no entanto, o que se viu foi um emaranhado de problemas internos, troca de acusações entre os grupos políticos que brigavam pelo poder, denúncias de corrupção na gestão de contratos de patrocínios, dívidas a dar com pau e erros primários, até ingênuos, do novo presidente alvinegro.
O próprio Rubão foi tragado por esse lamaçal e acabou destituído. Para completar o cenário de desconfianças de que a farra iria perdurar por muito mais tempo, o time montado para os torneios de 2024 revelou-se muito frágil, a ponto de não ter sido classificado para a fase decisiva do Paulistão e passar quase todo o ano brigando para não cair para a Série B do Brasileirão.
SIGA THE FOOTBALL
Facebook
Instagram
Linkedin
Threads
Tik Tok
Chegar à conquista do Campeonato Paulista neste início de temporada, desbancando seu maior rival e impedindo-o de chegar ao inédito tetracampeonato, serve como uma válvula de escape para tanto sofrimento acumulado. Um alívio.
Quebra de jejum
A redenção – e, talvez, o ponto da virada de chave para a retomada do caminho de glórias do clube de Parque São Jorge. O que, na linguagem desafiadora de Rubão, confirma a esperança de que, finalmente, acabou a farra dos adversários. O Corinthians é de novo campeão, depois de cinco anos de absoluto jejum, alimentado por crises, revolta de torcedores, derrotas acachapantes, fracassos em horas decisivas e um completo desequilíbrio na montagem dos elencos para cada temporada.
No desespero para acabar com a farra dos outros, e sem dinheiro para orientar contratações acertadas, o clube abusou do direito de trazer jogadores sem a menor qualificação para atuarem no time da maior torcida do Estado. Houve um tempo em que havia mais de 100 jogadores sob contrato e uma dezena de treinadores na fila da cobrança de multas rescisórias, de acordos interrompidos. Era vexame após vexame.
Melhor campanha do Paulistão
O que fez o Corinthians mudar de realidade, da fala de Rubão ao título desta quinta-feira? Essencialmente, a montagem de um time confiável, que passou a ser respeitado pelos adversários e apoiado pela Fiel.
Os primeiros sinais de que, enfim, havia uma equipe organizada, um elenco equilibrado, e a reunião de jogadores acima da média para o padrão geral dos últimos anos, foram observados na espetacular reação da equipe no Brasileirão do ano passado, quando o time saiu do Z4 para ganhar uma vaga na pré-Libertadores.
É bem verdade que a eliminação precoce na fase anterior aos grupos da Libertadores reacendeu uma suspeita de fraqueza. Mas as finais do Paulistão provaram que aquilo foi um acidente de percurso e que o time ainda merece a confiança da torcida.

No meio dessa caminhada, como acontece no futebol brasileiro a torto e a direito, o trabalho do técnico Ramón Díaz chegou a ser contestado e muitos pediram sua cabeça. O treinador argentino, e seu filho e fiel escudeiro Emiliano, no entanto, assumiram a bronca e nunca desistiram da ideia de mostrar que o trabalho merecia ser continuado. O título do Paulistão, para eles, é um selo de qualidade que buscavam no Brasil.
O que fazer com Ramón Díaz?
O mérito da família Díaz foi trabalhar no sentido de achar um time, definir um esquema tático, e voltar a fazer da Neo Química Arena um aliado da equipe nos duelos mais complicados. E assim aconteceu nesta noite, num Itaquerão enlouquecido, inebriado de amor e fé, tomado do primeiro ao último minuto pela crença de que a mística do time que joga com raça e com o coração estava ali de novo presente, pulsante, a marcar os passos de uma resultado libertador.
O título deu à Fiel a chance de uma catarse coletiva de superação dos dramas e exorcização de todos os seus fantasmas. O Corinthians voltou a ser campeão porque apostou num grande goleiro par substituir o mítico Cássio. A chegada de Hugo Souza devolveu a segurança que parecia ter ido embora com as saídas sucessivas de Cássio e Carlos Miguel. E Hugo viveu mais uma noite de herói.
Mesmo com defeitos e dificuldades no jogo aéreo, a defesa acabou se acertando nos jogos finais e não comprometeu. A chegada do argentino Fabrizio Angileri pôs fim ao desalento da torcida toda vez que jogava Hugo ou Bidu na posição.
O jogo de Memphis
No meio campo, Díaz conseguiu achar os espaços certos para Carillo e Martinez, que passaram a ser os grandes condutores do setor, com mobilidade para atacar e defender, ora assessorados por Ranieli, ora por Breno Bidon.

Mas foi no ataque que o Corinthians pavimentou o caminho para estabelecer na prática o sentido da bravata de Rubão. Rodrigo Garro, Memphis Depay e Yuri Alberto formaram um trio valioso, que desequilibrou vários jogos em favor do Timão.
Com eles em campo, o Corinthians ganhou corpo, passou a ter volume ofensivo, achou o caminho do gol e transformou-se num time de novo competitivo, capaz de enfrentar qualquer adversário em condições de igualdade.
É óbvio que não se pode dizer que o time está pronto para seguir ganhando campeonatos ao longo da temporada. Ainda é uma equipe em construção, que precisa de ajustes na lateral-direita, na zaga, e na ausência do seu trio de ataque titular. Portanto, se a farra acabou mesmo, só o tempo dirá.